domingo, agosto 06, 2006

Segunda parte... Conto Trinta Anos...

2 - O Esquecimento

Num repente tudo se foi. A música, a imagem e até mesmo as lembranças da noite anterior. Quando Eu voltou a si, percebeu que não se recordava de nada do que tinha acontecido naquela manhã, nem mesmo de como havia saído da cama e caminhado até o banheiro. Olhou para o relógio e percebeu que estava muito atrasado, o que fez com que cumprisse o ritual matutino mais rápido do que o costumeiro, esquecendo o que não conseguia se lembrar.

Quando reparou melhor, chegou a achar graça do seu próprio pensamento – esquecer do que não conseguia se lembrar. Ora, se esquecer do que não havia se lembrado na verdade era deixar de tentar lembrar o que já tinha sido esquecido, tudo isso nada mais era do que deixar a lembrança que já tinha sido condenada ao esquecimento, nele permanecer. Quem era ele para recuperá-la? Esta questão começou a assustá-lo.

Certamente esta lembrança havia sido objeto de uma justa avaliação e por não conter as qualidades daquelas que devem ser guardadas, foi instantaneamente liquidada. Pronto, não pensaria mais sobre isso, pensou – ainda mais uma vez – antes de tomar seu café preto.

Eu trabalhava em um banco e apesar de nunca ter se dado muito bem com números, podia ser considerado um bom profissional. Digo considerado, pois é o que ele era para os outros, já que a sua análise pessoal era bem mais dura, para ele, era simplesmente um medíocre.

Medíocre porque em momento nenhum da sua vida, Eu havia pensado seriamente sobre o que iria fazer ... as situações foram acontecendo e assim Eu não poderia nem mesmo precisar de que forma havia se tornado um bancário. Na verdade, até aquele momento, ele nunca havia pensado nisso e isso o deixou inquieto.

Logo após o almoço, Eu se deparou com o Outro novamente, desta vez, no reflexo da tela do computador. Os olhos do Outro mergulharam fundo nos olhos de Eu e foi só depois de alguns segundos que Eu percebeu o que estava acontecendo e se lembrou imediatamente da noite anterior, daquela manhã e pensou – Afinal, quem é o Outro?

Ele não precisou nem mesmo dizer estas palavras para que o Outro respondesse: - Você bem sabe quem eu sou, mas você também sabe que esta não é a pergunta certa... – Eu retrucou em pensamento: - Que pergunta é esta? E o Outro murmurou – Quem é você ?, ao dizer tais palavras a imagem foi sumindo e permaneceram apenas os olhos do Outro, olhando atentamente para os olhos de Eu, dupla de olhos ligadas pelo fascínio do impossível, tentando compreender como poderiam serem a mesma pessoa e ao mesmo tempo tão distantes, tão diferentes, tão imprecisos...
CONTINUA...

0 Comentários:

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial