segunda-feira, maio 29, 2006

Festa do divino

Na linha dos escritos de viagens... neste final de semana conheci um lugar que há muito queria... a cidade de são luiz de paraitinga na festa do divino... aí vão as impressões...


Reflexões sobre são luiz do paraitinga

SOLIDÃO

Só agora percebo... vim até ti para tentar encontrar o divino que habita em mim. Ensaiei esta viagem tantas vezes. Há exatos dois anos atrás ela quase foi possível, investiguei, perguntei mais ainda não tinha a coragem necessária para te confrontar. Neste ano, também não fui eu que te procurei... quando percebi já estava com as malas prontas rumo ao teu destino. Festa do divino.

Cheguei em ti mais tarde do que esperava. A fome na estrada, o café e a conversa amiga me detiveram mais tempo do que o programado. Logo que te avistei, encontrei tuas casas, tuas igrejas e tua praça. Postas como um cenário pintado. Senti-me invasora do teu enredo. E por mais que tentasse, simplesmente não compreendi o teu contexto. Limitei-me a ver o que me era dado a olhar. O encontro das bandeiras. Uma procissão acompanhada da banda, pessoas carregando estandartes com o símbolo da pomba branca. A dança de fita das meninas. Ensaiando a verdadeira beleza por entre o olhar atento da professora. O casal festeiro deste ano – a primeira-dama e o prefeito – ao receberem a bandeira vermelha com fotos dos devotos deram um sorriso protocolar do festejo. Mero simulacro do meu já apagado desejo.

O congo começou tímido, ainda era seis da tarde e a missa do divino ainda ia começar. Mesmo assim, a procissão ainda seguiu ao teu altar improvisado, na casa defronte à igreja – do outro lado da praça – tudo era vermelho e dourado e o nome de império dava vida antiga ao que era para mim simples mistério. O sono me invadiu como um exército inimigo e resolvi descansar enquanto a programação da festa se resumia à missa na igreja matriz.

Quando voltei à ti, recuperada do afogamento do meu sono, a noite já tinha caído. As luzes, as bandeiras e as pombas brancas davam a impressão da festa que já tinha se iniciado, mas para mim ainda era apenas um esboço. O bingo, a mandioca frita, o vinho quente e o quentão deram alento ao meu coração. Por um breve momento não me senti tão só. Mas foi quando os congos e moçambiques recomeçaram é que percebi que o meu encontro naquela noite era com o meu próprio eu solitário. A melodia e as bandeiras, os tambores e as fantasias de marinheiros, reis e rainhas com requipes de etéreos eram apenas detalhes. A minha visão era um verdadeiro embaço sem compreender ou entender o que tu me mostravas. Experimentei como nunca a solidão em ti. Solidão do ouvir, solidão do sentir, solidão do estar.

Percebi que em ti o divino tem cheiro de gente, mas nem por isso me senti convidada a compartilhá-lo. Gente de todas as cores, raças e idades. Gente que assim como eu, muitas vezes carrega o divino em si sem nem o saber, sem nem o perceber. Talvez por isso tenha me sentido tão só. Ao ouvir os cânticos ao São Benedito percebi que diferente daqueles homens não tinha a quem pedir proteção. Não naquele momento, não daquela forma. Senti como nunca que não participava daquela comemoração. Talvez em outra hora.

Algo diferente aconteceu quando duas congadas se encontraram, cada uma vinha de uma direção da rua e conforme os sons das duas se misturavam, uma névoa forte e espessa caiu do céu, o ar ficou mais frio. Neste momento olhei para dentro de mim e deixei de me sentir tão só. Assim como a névoa, senti que também fazia parte do cenário. Mas o momento passou rápido, logo uma se calou e ouviu atentamente a outra cantar. A névoa quase instantaneamente se levantou e eu passei novamente a não fazer parte da festa.

No dia seguinte, a luz do sol e seu calor me mostraram outra cidade. Ainda enfeitada pelo divino, ainda com cara de festa, linda, bela e enquadrada como um delicado retrato. Vi na fonte do teatro, a grade que cobria a seqüência de casas coloridas no ponto mais alto da cidade. A mais bela vista do cenário. Ao lado, a igreja da nossa senhora do rosário com um cemitério. Todo branco e enfeitado de flores.

Apesar de tu ainda estar vestida para a festa, pude me sentir mais á vontade. Já havia me acostumado com a solidão do meu divino. Isso não mais me incomodava. Talvez não me incomodasse nunca mais. Isso não o saberia naquele momento.

A única certeza é que tu me trouxeste a solidão como única possibilidade de conhecer o divino que habita em mim. E isso nem posso agradecer. Ainda não consigo dizer mais do que isso. Prezado divino meu, obrigada por tu simplesmente existir.

domingo, maio 28, 2006

Porto Pós- Morto...

O cais do porto,
O porto do cais,
Onde está o que me leva e o que me traz,
A água é como o vento,
Permanece igual porque está sempre diferente,
Não muda o que sente,
Apenas traz à superfície o que ressente.

O tempo também não envelhece,
E por isso sempre permanece,
Mesmo quando a sua própria memória esquece.

O uivo da natureza,
Entre o grave e o agudo,
Exprime a beleza da tristeza,
Que apesar de volúvel,
Não perde a sua destreza.

Todos imprecisos,
Mostram a porção que toca o meu olhar,
E me dá a certeza,
Que apesar disso tudo,
Trago em mim a clareza da permanência,
A abundância da ausência,
Sem definição nem solução,
Mas que é a própria essência da igualdade misturada com a diferença,

Ambos ligados à amplidão da consciência,
Inerentes à resistência da procura de achar o vazio,
Que apesar de só,
Encontra o seu lugar no meu peito, no meu leito, no meu lar.
Mero cais do porto,
Ponto pós-morto do meu descansar.

terça-feira, maio 23, 2006

Plano Piloto...

Avistar-te de cima,
Mostra os contornos da sua rima,
De um lado, uma asa esticada,
Do outro, outra asa que apenas parece mais recatada.

Dizem que teu plano é piloto,
Mas o que sinto quando em ti aterrisso,
Não é um plano, é desconforto,
Vontade de te ver um pouco desajeitada,
Para em ti, facilitar a minha estada.

Aí, percebo que este aparente desconforto,
É miopia do meu olhar acostumado a admirar,
A inexatidão do desassossego,
Marca indelével da cidade que carrego no meu enredo.

Apenas quando me entrego ao teu plano,
Não importa se piloto,
É que consigo vislumbrar teu horizonte infinito,
A mostrar a linha reta ao meu umbigo,
Acostumado apenas a olhar,
O que perto dele costuma se encontrar.
Neste momento me torno ponto inativo,
Que mesmo míope e corrosivo,
Encontra na tua aridez, uma forma de saciar a minha avidez,
De tudo o que ainda não vi, nem senti,
Mas sei que me espera,
Fora da tua sensatez.

segunda-feira, maio 22, 2006

Em busca do destino...

Não mais olho para trás
Agora encaro somente o futuro,
Pois sei que é somente lá,
Que encontrarei meu sentimento puro.

Não é negar o passado,
È simplesmente deixá-lo ao lado,
Para que a sensação imprecisa do afago já dado,
Não confunda meu sentir ainda encruado.

Por muito tempo permaneci parada
Apenas olhando a estrada,
Depois que comecei a andar,
Não posso mais me desviar do traçado da minha alma.

Não conheço meu destino final,
Aprendi a me contentar com as belezas do caminho,
Pois percebi que a vida é aquela que passa,
Exatamente enquanto você a espera,
Calada e em completo desalinho.

domingo, maio 21, 2006

Depoimento sobre a Homenagem...

Como uma das homenageadas se manifestou publicamente sobre o texto... aí vão as suas palavras...
bjos, Tatiana
"Engraçado que hoje de manhã vim no carro pensando nessa minha "contradição ambulante" .
Fiz uma lista delas, vejam só:
- Sou fã de carteirinha do Chico Buarque, mas o último CD que eu compreifoi do MC Leozinho (Se ela dança eu danço...) e PIRATA !
- Eu trabalho num Banco inglês, mas acho o que o BIN LADEN fez tudo de bom!!
- Eu amo os animais e defendo a natureza, sou cadastrada na Suipa e faço doações mensais ao Greenpeace, mas não me convida p/ acampar no meio domato com um monte de bicho pq eu EU NÃO SUPORTO !
- Eu adoro foie gras , mas parei de comer pq tenho dó do ganso
- Por outro lado tmb tenho dó da vaca, mas não consegui parar de comer carne !
- Eu detesto peixe, mas adoro sushi (pq na minha lógica maluca, peixe cru não tem gosto de peixe!!!)
- Eu tenho nojo de saliva, coco e vômito de gente, mas não tenho nojo desaliva, coco e vômito de cachorro
- Eu assisto escondido o Chaves, o Superpop e o Medalhão Persa (aquele quevende jóia pela televisão)!!
- Eu gosto de coisas que não confesso ... tipo feijão com macarrão e filmeda Disney com as gêmeas Olsen !
- Eu odeio coisas que não confesso ... tipo Zélia Duncan, filme francês e Guarana Diet
- Eu odeio coisas que todo mundo gosta ... tipo sorvete, bolacha recheada, iogurte e ovo de páscoa !
- Eu leio Shakespeare em inglês ....mas "ouvo" Pânico e dou risada toda vez que vejo o Homem Beringela !
- Meus sonhos possíveis e não realizados são:
1 - conhecer o Didi Mocó Sonrisal Colesterol Novalgina Mifume (Audácia da Pilombeta!) e
2 - Ter todos os produtos que a Polishop vende (principalmente a Table Mate, aquelaescova que gira sozinha, e aquela cinta que diminui as medidas em até 2números!)
- Meu sonho possível e não realizado por MINHA MÁXIMA CULPA: ter um livroautografado pelo Mário Prata. Cansei de encontrar com ele no Balcão, mas fiquei com vergonha de "chegar junto"!
- Eu prefiro ser irônica ao invés de ser grossa .... nem sempre consigo !
- Eu não me lembro nem da cara nem do nome de 90% das pessoas que já passaram pela minha vida, mas sou capaz de citar em ordem alfabética todos os atores e diretores de cinema e novela (mesmo que eu só tenha visto um único trabalho deles na vida) ! Isso realmente queria que alguém me explicasse :como é que eu sou capaz de lembrar do nome de um atorzinho mediocre em um filme obscuro, mas não me lembro do nome do cara que tá fazendo reunião comigo pela 3a. vez ?!?
- Ultimamente tenho tido uma vontade incontrolável de mandar e-mails p/Fernanda Young e p/ Luana Piovani ...só p/ dizer que sou fã delas !
- Eu DESTESTO dar bom dia, boa tarde e boa noite .... acho uma cortesia hipócrita e desnecessária ! Mas sou a favor do "por favor" e do "obrigado"
- Embora eu adore bebida bem gelada, eu SEMPRE, absolutamente SEMPRE peço água com gás sem gelo e sem limão no copo
- Eu faço comentários p/ mim mesma em voz alta quando estou assistindo televisão, e às vezes, quando o comentário é muito bom, eu ligo pra minha mãe ou pro meu pai p/ repetir o comentário p/ eles !
Ainda bem que vcs gostam de mim mesmo assim ! Pq a Tati acertou em cheio.... na maior parte das vezes o que eu penso é o tudo misturado com onada ! E se alguém puder me ajudar a conhecer o Renato Aragão antes dele morrer eu seria ETERNAMENTE grata !
Beijos a todas !
Angela"

Homenagem à amigas...

ERA UMA VEZ...

Era uma vez cinco amigas. Este número nunca foi assim tão certo. Todas se conheciam há muito tempo. Algumas desde a infância, outras desde as aulas de inglês na adolescência. Nem sempre o grupo foi esse.
Na verdade, era quase como uma teia que neste momento tinha se efetivado nestas pontas. Não eram as únicas. Haviam outras pontas. Mas que estavam mais afastadas. Ao menos por enquanto.
Eram todas muito diferentes.Uma delas era a mais sincera. Não tinha o menor pudor de dizer tudo oque pensava. Mesmo quando o que pensava era o tudo misturado com o nada. Tinha a sabedoria de conter em suas posições visões tão antagônicas que às vezes - só às vezes - deixava as outras sem ação e sem fala.
A outra era a que mais evitava os embates. Talvez pela sua ancestralidade oriental que além dos olhos um pouco rasgado e a fala mansa lhe dava a possibilidade de acalmar as outras com o seu simples silêncio ou até com o barulho - que era sempre pouco lúdico, disso ela fazia questão.
Tinha uma que em virtude da sua longa e variada jornada de trabalho, muitas vezes não conseguia comparecer aos encontros, que ultimamente, haviam se tornado mais raros. Mas era tão atenta e sensível que não deixava de contemplar todas as outras em todas as suas necessidades. Mantinha uma alegria e leveza que as outras admiravam.
Outra era um próprio escorpião que não poucas vezes virava peixe. Buscava tanto o entendimento e o equilíbrio que não raras vezes trazia para si o embate que estava em outras paredes. Tinha muita habilidade para perceber e entender as pessoas e talvez por isso gostasse tanto de oferecer flores cheias de cheiros. De várias cores e tamanhos. Para vários sentimentos e entranhas. Era quase uma alquimista que gostava de ver todos os outros com sorisso de artista. Mesmo que o espetáculo fosse apenas sobreviver à vida, com força e ensaio com fantasia.
A outra alguns diziam que era doce, outros que era amarga. Talvez pela sua própria ambiguidade e paixão ela conseguisse ser as duas coisas ao mesmo tempo quando falava ou calava, porque até mesmo quando permanecia quieta fazia questão de ser entendida na quimera.
Mas o melhor de tudo é que era o olhar de cada uma que fazia as outras serem o que realmente eram. Dúbias, apaixonadas, emotivas, frias e ainda assim encantandoras. Cada uma com o seu próprio canto que só alcançava o brando estar conjunto.
Talvez fosse por isso que os encontros fossem raros. Talvez fosse por isso que apesar de tantas diferenças, elas simplesmente se amavam.Respeitavam as fragilidades das outras, pois no fundo era uma forma de aprenderem a respeitar as suas próprias fragilidades. De perdoarem seus seus próprios erros. E emendar a vida como ela fosse realmente uma felicidade. Ambígua e inconstante como elas eram na verdade. Mas cheias de flores da primavera. Era o que cada uma era para outra. Não só nesta, mas também em outras eras...

terça-feira, maio 16, 2006

Desabafo...

Hoje adordei e não sabia muito bem qual era o pesadelo esperado...após quatro dias de acontecimentos cinematográficos, contagem recorde de mortes, escombros de incêndios e pânico generalizado, percebi que o único incômodo na manhã era mesmo o vento gelado... fui ao parque e pude ver as árvores que há tanto não olhava... via mas não olhava...o verde delas me invadiu e pensei seriamente em desativar da minha mente aquele alerta que desde ontem fora acionado... o alerta de obedecer a uma ordem típica de toque de recolher sem nem saber quem a tinha dado... todos falam em homens em motos ... aviso ou ameaça??? uma dúvida - nem tão dúvida assim paira no ar... o mesmo que hoje cedo estava bem gelado.

Ainda não sei o que falar. Acho que a indignação e a sensação de assistir um teatro milimetricamente calculado me impede de analisar as coisas pelo o que elas são, então evito este tipo de comentários. Não tentarei encontrar razões, justificar ações, mas apenas dizer da profunda tristeza e angústia no meu coração. Pessoas morrendo como moscas e muitos preocupados apenas em justificar as incompetências,outros apenas reiterando as suas sensações de pavor e medo...totalmente justificados mas como tudo na vida com momento certo de deixar o cenário... até porque quem certamente sentiu mais medo não mora no jardins nem anda de carro...

O que vislumbrei no horizonte desta manhã gelada fez com que o aperto no meu coração aumentasse... ao atravessar a nove de julho - vi passando em meio aos carros e ônibus, uma ranger da polícia militar, com quatro policiais de arma em punho, cotovelos nas janelas abertas e um olhar cheio de ódio para cada uma das pessoas que ali passava...neste momento tive a certeza de que o pequeno saldo de mortes de"suspeitos" desta última noite é apenas o início... o mero início de uma história que certamente nenhum paulistano sentirá orgulho ou saudade... e cada um de nós sabe muito quem serão os maiores prejudicados... também não serão os que moram no jardins e andam de carros...

domingo, maio 14, 2006

Desencanto

De ti não esperava,
Nem o silêncio,
Muito menos, o nada.

Num repente,
Tudo mudou,
O seu aparente apreço,
Transformou-se em desconforto,
O meu indisfarçável desejo,
Em ponto morto.

Um mero beijo,
Algumas frases ditas como num despejo,
Foram suficientes,
Para desterrar o medo.

Nem sei mais o que sinto,
É tanto desencanto,
Que o medo se tornou teu manto,
E a tristeza calou me canto,
Com a força do pranto,
No meu centro vivo,
Perdido entre a ironia do momento,
E o meu intento lento,
Sem lamento ou improviso.

Sinto-me cheia do nada.
Aquele que de ti não esperava...
Mas que me foi a única lava,
Do teu vulcão extinto,
A lavar a minha mágoa,
Do teu sentimento não dito...
Da minha fé não poupada,
Do discreto erro erudito,
A me deixar só, sem grito,
Apenas com meu olhar maldito,
Perdido e aflito, a procurar a estrada,
Para fora do teu rito.

quarta-feira, maio 10, 2006

Declaração de amor ao tempo...

DECLARAÇÃO DE AMOR AO TEMPO

O tempo parece que parou
Apesar do vento, apesar do vôo, apesar do sereno,
Tudo parece igual, mas também está diferente,
É como se o tempo não quisesse ser passado, nem futuro,
Desejasse ser para sempre presente.

Pressente o tempo, a falta que ele faz,
Pois na sua ausência,
Tudo fica misturado, nunca sabemos ao certo,
O que já foi, o que ainda é e o que virá a ser...

O tempo traz mesmo mistério,
Leva consigo aquilo que não consegue controlar e
Depois deixa tudo solto,
Bem quando não há mais para onde se voltar,
Estrada sem rumo,
Barco sem prumo
O tempo não se cansa de passar...

Passe tempo,
Deixe de ser simples passatempo e deixe a vida entrar...
A convide para dançar e não a deixe até que a última nota de música possa soar...
Ouça, escute, fique atento,
A música não pode parar, pois como o tempo ela sempre permanece,
Mesmo quando apenas o silêncio pode entoar...

Passe tempo ouça música...
Deixe o silêncio, só o tempo é capaz de dar a voz que ele tanto precisa,
Voz que traz a alegria para o hino da vida que alivia,
As dores e os risos,
Ambos presos na castidade da agonia.

Mas quando menos se espera,
O tempo chega e liberta o som do silêncio, som do tempo, simples passatempo,
Para que possas simplesmente passar...
Sem o peso da vida vivida, mas com a alegria da vida sentida,
Vida solar, quente e ativa,
Que só percebi no momento em que comecei a te amar,
Belo tempo,
Completo passatempo,
Do coração que por ti não consegue parar de pulsar...

segunda-feira, maio 08, 2006

O Suspiro...

Ela sabia que aquele suspiro significava a falta que ela sentia dele. E não era uma falta só de pele. Era falta da voz, da respiração, da sua simples presença na sua fome. Todas as vezes que ela suspirava, ele logo a abraçava por trás. Principalmente quando o suspiro escapava nas manhãs ao despertar.

Aquela era uma mania antiga. A primeira coisa que ela fazia ao abrir os olhos era dar um longo e sonoro suspiro. Misto de preguiça, agradecimento e contentamento. E acabou se criando um código, o suspiro dela pedia o abraço dele, quase sempre por trás. Afinal, era sempre ele que se preocupava em abraçá-la durante toda a noite. Ela sempre virava para o lado de fora da cama e era sempre ele que dormia olhando para o interior dela. Com cuidado e a abraçando com carinho, quase como se fosse um berço a embalar seu sono tão vazio e tão sozinho.

Mas naquele dia ela sabia que depois do suspiro não haveria abraço. Nem fita, nem laço. Nenhum presente a esperava para fora daquele embaraço. Por isso, quando veio o suspiro o que o seguiu foi um soluço. Profundo e em completo desatino. Como se a explicar para aquele suspiro que o código se rompera. Não havia mais os braços dele para o acalmar nem para dizer o quanto aquele dia seria bom.

O soluço se transformou logo em choro. Mas não era um choro sentido nem calmo e sim um ritual de sacolejos que começava no meio do seu ventre e deixava todo o seu corpo a tremer, leve e perene. Esse choro durou muito, tanto que nem percebeu quando adormeceu novamente. Ao acordar, os olhos não abriram com a mesma facilidade, afinal havia chorado tanto que eles estavam meio inchados, pareciam duas bolas de gude de plástico, daquelas vermelhas e sem asco, mas com toda a dor da falta do abraço que não a embalou naquela manhã.

Pensou consigo mesma, é querido suspiro, você vai ter que se acostumar a acordar sozinho, pois essa sua choradeira me deixou até cansada. O suspiro respirou aliviado e lhe disse baixinho, fique tranqüila, logo me acostumo com a solidão, só te peço que no próximo abraço, tu possas também dormir virada para os braços, pois um dia eles se cansam de só abraçar sem serem abraçados.

Ela percebeu que uma nova lágrima inaugurava o rosto ainda inchado e respondeu, com os olhos presos no chão, fique tranqüilo suspiro, os próximos braços que te abraçarem serão tão bem-vindos que eu não somente dormirei de frente para eles como os abraçarei todas as noites sem nenhum cansaço. Ela ainda suspirou mais uma vez antes de dar o próximo passo para fora da cama. Agora sem nenhum estardalhaço. Apenas com seu solitário coração batendo forte como aço.

domingo, maio 07, 2006

Mar de Sal

O mar que leva e traz
Aquilo que me compraz
O que me serve e o que não serve mais.

Mar doce de águas salgadas,
São do seu sal que as lágrimas dos pescadores se socorrem,
Quando em ti encontram a fome.
Não a fome de comida,
Mas a fome de terra batida,
De donzela aguardando furtiva.
Para matar a saudade,
Antes da próxima partida.

Vai mar doce.
Leva o salgado da vida,
Traz de volta o pescador,
O faz ser para sempre livre desta fadiga,
Da lágrima de sal,
Sinal amargo da vida.

quinta-feira, maio 04, 2006

Mais um conto...

APOCALIPSE

Quando tudo aconteceu, a inocência reinava tanto no sol quanto na lua. Como nós nos conhecemos não importa, simplesmente aconteceu. Foi uma dessas poucas coisas da vida que não precisa de explicações e quando você dá por si, já foi.

Eu ai todos os dias àquele lugar e nunca havia reparado nela. Porém, naquele dia sua cor e seus acessórios estavam especiais e eu como um pobre cachecol não pôde deixar de notar a maciez e a textura da malha que a produziu. Era realmente uma linda blusa.

Quando ela me viu, percebi que sorriu e conduziu, não sei como, sua dona até meu dono. Ela parecia realmente receptiva e aproveitei uma aproximação.

Conforme nós conversávamos, os animais que povoavam os céus desciam e ficavam fascinados com nossas feições que adquiriam formas bizarras que pouco a pouco lembravam a felicidade. Os anjos apareciam e não acreditavam na nossa mágica.

As horas se passaram rapidamente e, quando notei, meu dono já estava se preparando para partir. Sua dona também estava quase indo embora, quando numa escorregadela passei para o seu pescoço e senti a emoção de tocá-la. O sentimento de pertencer era mínimo; a emoção de sentir era pouca, a atração de fundir tudo era máxima.

Meu dono se desculpou e insistiu em me trazer de volta, mas eu não queria, desejava passar o resto dos meus dias sobre a sua maciez. O bar já não parecia tão claro e nós continuávamos como se nada houvesse acontecido, afinal os animais estavam no céu e os anjos continuavam a cair das nuvens.

A inocência do Sol já era da Lua quando finalmente uma mão conseguiu nos separar. Anunciava-se a extinção de nossa raça. Morriam os amantes, sobreviviam os animais.

terça-feira, maio 02, 2006

Encontro

Andar sem destino. Sem me ocupar com pensamentos ou desatinos. Simplesmente andar. Movimentar as pernas rumo ao infinito como se assim pudesse chegar ao ponto inativo do meu desejo. Do meu sentido. Mas ao andar indefinidamente me veio o suspiro. Suspiro descontente de quem ainda não encontrou o seu indefinido estar sem tino. Foi aí que parei.

As pernas bambearam como se atrasadas a captar a minha vontade, os braços se ergueram como se tontos e inexpressivos pudessem dar o tom do medo, mas foi à boca, com seus dentes, saliva e língua que comandaram o show do corpo contra a mente. O grito.

Um grito forte, insuspeito como um corte. Entre o agudo e o aflito. Sem conseguir se definir, sem sorte. Assim, sozinho, o grito foi capaz de debelar a minha ironia.

Continuei a andar, mas sem a mesma teimosia. As pernas agora já não mais me obedeciam, eram autônomas, sozinhas, pequenas ladainhas do meu eterno murmurar intermitente. Os pés, que antes pareciam nem existir, também fizeram um ato de rebeldia, ensaiaram uma dança - o que me lembrou o tom rubro dos sapatos de um conto, perdido nas memórias da infância.

As mãos pareciam serem as únicas que junto comigo, tentavam lutar contra todo esse improviso. Movimentavam-se inquietas, como se a dar o comando para os braços, ombros e tronco da minha necessidade incompleta; da veracidade da entrega.

Foi uma luta árdua, nem sei quanto tempo durou. Mas foi o seu resultado que mais me marcou. Ninguém ganhou. O corpo foi vencido pelo cansaço e a minha vontade pelo acaso, quando vislumbrei fora do campo de batalha, a medalha que me chamava.

O seu rápido e imediato olhar, sem nenhum susto ou atraso, impassível, a completar os meus, sem nenhum enquadro possível. A partir daí, continuar a andar se tornou simplesmente um passo após o outro, sem euforia ou descaso, cumprir o destino que se anuncia de percorrer um pedaço para depois iniciar outra trilha, outra caminhada. Mais pura, mais vazia, repleta de flores perfumadas. Não estava mais mergulhada no confronto, mas no nosso simples encontro. Do vazio com o infinito, do estar só, mesmo quando tudo parece urgente e aflito. De dar de cara com outra ausência, cheia de perdas, quando tu ainda carregas as tuas próprias lendas, os teus próprios ritos.

segunda-feira, maio 01, 2006

FUGA

A necessidade de me ausentar de mim,
Faz da fuga meu começo,
Da solidão meu ponto seco,
E do meu corpo, simples endereço.

No abraço da cruz alta,
Sinto enaltecida calma,
A adentrar meus poros,
Como um veneno, uma mágoa,
Cheia de névoa seca,
Na loucura que de mim salta.

A correr no labirinto,
Enlouqueço como um bicho limpo,
A negar minha natureza,
Ainda impregnada da crueza,
Repleta de delicadeza,
A mostrar o caminho findo.

Me perco sem achar,
O que posso em mim me encontrar,
Perdida no teu olhar,
A enquadrar a minha fome,
Que em ti se insere,
Sem calma ou alma,
Só com a pele.

Tanto colorido me afugenta,
No calor do improviso,
O que me alimenta,
É apenas um sorriso,
Que esconde a fome da poesia vivida,
No clima da morte lenta e quase fria

Asas de Dormir

ASAS DE DORMIR

Contigo perdi o medo,
De me perder se necessária for a mudança,
Pois percebi que o enredo,
Sempre encontra desfecho,
Independente da vizinhança.

Pode parecer pouco,
Mas é muito para mim,
Pois faz do que é naturalmente solto,
Leve, quase morto.

Sempre tive muito apego,
Ao passado, às raízes, ao aconchego,
Só contigo consegui entender,
Que basta ter o sossego para encontrar,
Aonde quer que se vá,
A sensação do eterno e simples estar,
Sem agonia ou medo.

Pertencimento se cria com a terra,
Mas terra é sempre terra,
A única diferença é o arado do teu desejo,
Por isso sinto o permanente bem estar,
Dormindo nas tuas asas,
Quase asfixiada com teus beijos.